8 fev
2010
Categoria: Notícias
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Reflexões sobre o livro A Cabana

Acabo de ler o livro A Cabana, de William P. Young, que chegou no Brasil como best seller americano e tem se popularizado muito. Embora eu tivesse lido algumas resenhas sobre o enredo em jornais e revistas, o livro acabou não sendo nada do que eu esperava. O que mais frustrou foi o fato de que até agora eu não consegui definir se eu gostei ou não. Porque, de fato, tem partes interessantes e tocantes. Mas como espírita, simplesmente não dá pra parar de pensar que existem explicações melhores para o sofrimento humano e os propósitos de Deus.
O livro é cristão e não se filia a nenhuma religião específica. Eu não vou contar muito do enredo em si. Mas, se você não curte saber de antemão, pare de ler aqui. Pare mesmo. O livro conta a história de Mack, um pai de cinco filhos, que passa um final de semana em um acampamento, onde Missy, sua caçula, desaparece. Tudo o que a polícia encontra é o vestido ensangüentado da menina em uma cabana na floresta. Atormentado e culpando Deus pela morte da filha, ele volta ao lugar trágico anos mais tarde e tem uma longa conversa com Deus, Jesus e o Espírito Santo.
Pra começar, achei fantasioso demais, e até mesmo pretensioso, personificar as entidades, dizer suas aparências, como gostam de se vestir, comer ou que tipo de música ouvem. Muita gente vai questionar essa afirmação e dizer que isso na verdade não é importante (até porque, no próprio livro, Deus muda de aparência). Digo de antemão, concordo. Concordo plenamente. Ainda assim, me deixa, sei lá… desconfortável. Mas o que me incomodou de verdade foram as afirmações de passagens bíblicas, de Adão e Eva e de parábolas como se tivessem sido reais. Ok, o livro não afirma que É real, a história toda é tida como ficção de qualquer forma. Mas é estranho a manutenção dessas histórias, como se não fossem questionáveis, como se não fossem apenas alegorias para a transmissão de uma mensagem.
É estranho porque o livro se popularizou, acredito, justamente pelo contrário, pela mensagem de quebra de paradigmas de instituições humanas sobre Deus, sobre a igreja e a religião. A história mostra um Deus bom, amável, que não quer que as pessoas sigam simplesmente regras, mandamentos, mas que se abram pra sua existência e se permitam viver na sua paz, no seu amor, na sua bondade. O livro traz uma reflexão muito interessante sobre responsabilidades e expectativas, como regras que cerceiam nossa felicidade porque criam desapontamentos, muitas vezes cultivados em rancor. Também traz uma mensagem bonita sobre o perdão, sobre como não desejar o mal para alguém que nos tenha feito mal, evitando um relacionamento de ódio e, assim, permitindo a mudança do outro. A história mostra um Deus que não pune ninguém, que não deseja mal aos seus filhos, que os quer vê-los felizes e harmoniosos. Mostra que se o homem aprender a não guardar rancor, nada pode realmente afetá-lo e o que importa são os relacionamentos cultivados com amor.
É uma mensagem linda. Uma mensagem que o espiritismo há muito tem divulgado. Mas o livro não avança. Acalma o coração sofredor, porém não traz uma explicação satisfatória do porquê do sofrimento, das tragédias, dos desastres. O livro os credita ao mero caos como propósitos de Deus, sem apronfundar qual seria a verdadeira intenção disso, mas afirmando ser necessário para trazê-los para perto do Senhor, ou Papai, como se refere o livro. Para esse efeito louvável, entendo que a mensagem espírita é capaz de explicar melhor à luz das reencarnações, da lei de causa e efeito e do livre-arbítrio. O pensamento espírita põe causas passadas para o que atormenta o presente coração humano, tornando mais fácil a tarefa da resignação, de que o livro fala indiretamente. Com relação ao conceito de livre-arbítrio, o livro esboça uma idéia de independência, mas não chega perto de compreender a graça que é a liberdade de escolha de todo indivíduo e entende toda a história humana como pré-destinada. O mundo é o que é. E só. Não espere mais.
Isso é inconcebível para quem acredita na progressão intelectual, ética e moral da humanidade. O paradoxo do livro está em mostrar a importância do arrependimento e da mudança de comportamento, mas de uma maneira incompleta, sem muito propósito. Além do mais, como Deus poderia querer uma transformação tão profunda em uma única vida ou em uma vida após a morte de contemplação? Com que motivação?
O espiritismo é mais claro ao trazer a possibilidade do progresso coletivo e não apenas a satisfação individual de ter Deus consigo, embora este seja um começo importante, sem dúvida. Por isso, não quero desanimar a leitura do livro (embora este talvez já tenha sido o efeito causado, desculpe-me). É uma história bonita, que mostra que vive melhor quem é capaz de perdoar e amar. Isso é, de fato, importante e verdadeiro. O livro tem passagens belas e o final traz surpresas. Mas vale uma leitura atenta e reflexiva.

Então, O que achou?